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Criciúma
domingo, dezembro 10, 2023

Criciúma: O esporte como ferramenta de inclusão social

Projetos como o Anjos do Futsal auxiliam crianças seguirem o caminho da saúde e disciplina, além de inserir jovens, em condição de autismo, em atividades esportivas coletivas

Tiago Monte

Criciúma

Cada vez mais, o esporte tem papel fundamental na inclusão social de crianças e adolescentes. Ele promove o respeito, igualdade, disciplina e trabalho em equipe. Além disso, é um dos métodos mais eficazes para a retirada dos jovens dos “caminhos errados” oferecidos pela sociedade como criminalidade e uso de drogas.

Um dos projetos que mais inserem as crianças no esporte, sediado no Sul de Santa Catarina, é o Anjos do Futsal. A iniciativa, que nasceu em abril de 2001, é uma parceria entre Unesc e Anjo Tintas. Atualmente, 1260 crianças treinam, duas vezes por semana, em quadras de futsal de 22 cidades. São 26 núcleos que atendem os jovens. E o objetivo do projeto logo é comprovado pelos próprios jovens participantes. “Treino aqui todas as terças e quintas. Pra mim, é importante vir, porque eu quero ter um futuro melhor no futebol. Quero ser jogador e o projeto vai me ajudar para isso”, comenta Marcos Vinícius Geraldo Oliveira , de 13 anos.

Morador do bairro Paraíso, ele quer ter o futuro diferente, em relação a alguns amigos. “Tem vários amigos meus que seguem para uns ‘caminhos meio errados’. Tem uns que vão pro ‘caminho errado’, uns que vão pro certo… Eu quero treinar para ter um futuro melhor”, comenta.

O trajeto é feito de bicicleta

O deslocamento de Marcos, até a sede do núcleo que ele frequenta, na Unesc, não é fácil.“Venho de bicicleta. Camiseta, calção e bicicleta, mas eu não acho perigoso porque venho pela calçada. Às vezes, meu pai me traz. Faço isso porque quero seguir no projeto”, destaca.

No trânsito, de casa até a quadra de futsal, o franzino menino tem a companhia do amigo Vinícius Martins, também de 13 anos, morador do bairro Pinheirinho. “Venho de bicicleta, junto com o Marcos. Nós dois de bicicleta. Meu sonho é ser jogador e a maioria dos meus amigos não gosta de jogar futebol, então, eu venho para cá. Quero ser jogador de futebol”, diz.

E caso a carreira no futebol não engrene? Igor Dagostim, de 11 anos, morador do bairro São Defende, tem a resposta. “Vou ser barbeiro. Eu gosto da profissão. Corto meu cabelo ali no Pinheirinho e gosto dos cortes”, comenta. Entretanto, o sonho é alimentado constantemente. “Minha intenção é ser jogador de futsal. Gosto de futsal e futebol de campo, mas quero seguir no futsal”, diz.

Professor dá aulas de disciplina e cidadania

Ex-jogador profissional do Anjo Futsal, time que fez história em Criciúma, Rafael Poffo, de 41 anos, é professor do projeto, no núcleo da Unesc, há dois anos. Apesar da motivação dos jovens em seguirem a carreira de atleta, Rafinha, como é conhecido, destaca o objetivo maior do projeto. ”Dar essa oportunidade, principalmente pro pessoal que é mais carente, que não tem condições de, quem sabe, pagar uma escola esportiva, pagar sua mensalidade. De dar essa oportunidade de estar aqui, tirar das drogas, incentivar o esporte e qualidade de vida. As crianças aprendem a socialização, a gente cobra muita disciplina. Então, acho que é muito benéfico isso aqui. Nós temos várias crianças carentes aqui da região, da Unesc, que vêm aqui e tem essa oportunidade”, pontua.

Rafinha atuou como profissional por mais de 25 anos. Jogou em vários clubes do Brasil como Malwee, em Jaraguá do Sul. Foi campeão da Libertadores, Taça Brasil, Estadual, Catarinense, Paranaense, Seleção Catarinense e teve passagem como atleta da Anjo Futsal, onde o atual coordenador do projeto, Jean Reis, era o treinador. “Foi ele que me abriu as portas para o projeto. O foco principal do projeto é pra ajudar essas pessoas que têm mais necessidade”, destaca.

O professor faz questão de ressaltar a precariedade nas condições de algumas crianças. “Algumas não têm um tênis adequado pra jogar, apesar que o projeto disponibiliza de todo material: Camisa, calção e o meião, onde a criança tem que vir, duas vezes por semana no projeto com o uniforme.  A gente conversa com o atleta, vê as condições reais, e, geralmente, os atletas que estão aqui frequentando já tem uma turminha de amigos. Um vai ajudando o outro e, de qualquer maneira, a gente tenta buscar alguma coisa fora do projeto: talvez tirando dinheiro do bolso ou dando algum outro benefício para eles poderem estar aqui presentes”, comenta Rafinha

O núcleo da Unesc atende 70 crianças dentro do projeto. São duas turmas: categoria de 12 a 14 anos e também de 9 a 11 anos. A primeira turma treina das 15h30 às 17h e a outra às 17h30 até às 19h.

Espaço para alunos muito especiais

O projeto Anjos do Futsal conta com dois alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Um tem 12 anos e outro 10. Rafinha destaca o crescimento dos meninos e a inclusão social obtida com a atitude. “A gente deu a oportunidade dos dois participarem do campeonato, jogaram o mesmo tempo que os demais alunos. Foi uma questão que eu priorizei e dei a oportunidade para eles. É um crescimento e inclusão mesmo”, diz.

Os meninos nunca haviam jogado futsal e mostram uma evolução muito grande. “Eles nunca tinham jogado futebol, a coordenação motora muito ruim… Um tem um sistema um pouco mais agressivo, o outro um pouco mais calmo. Só que eles amam praticar futsal e evoluíram muito, no dia a dia, com os pais, em casa. Eles não perdem o treino e gostam de frequentar”, pontua o professor.

Para Lindomar Romancini, que é pai de Miguel, um dos meninos com TEA, a evolução no comportamento do menino de 12 anos é notória. “Tanto no relacionamento com outras crianças, como no conhecimento e domínio do corpo, coordenação motora, atenção com relação a coisas que antes ele não tinha atenção. Então, está ajudando muito ele e está em uma evolução bem legal, bem bacana”, comenta.

Com a inserção de Miguel no projeto, aumentou o interesse do menino pelo esporte. “Aumentou expressivamente o convite pra bater bola com ele. Até para ele querer me mostrar aquilo que ele aprendeu e que ele tá começando a dominar. Então, é um negócio que dá segurança pra ele e aí ele quer mostrar pra mim que tá com essa segurança”, destaca. O pai exalta o projeto. “Muito positivo, que o projeto dure muitos e muitos anos”, comenta.

Miguel expressa amor e carinho pela iniciativa. “Bem legal. Eu amo vir aqui pra cá. O treinador é bem legal, o Rafael, eu adoro ele”, detalha o menino. O pequeno atleta faz questão de detalhar todo o aprendizado obtido no projeto. “Consigo trocar passe, fazer drible. Esse ano já fiz bastante drible… E gols! Uns 40!”, comenta. “Ah! Eu também tenho jogado bastante futebol com meu pai e com minha mãe lá na praça”, completa Miguel.

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