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terça-feira, abril 23, 2024

Em Criciúma, lei surge para impedir servidores condenados a atuarem

Trazer mais segurança para a esfera pública de Criciúma é a pretensão da vereadora Giovana Mondardo (PCdoB), que teve recentemente o Projeto de Lei 55/2021 aprovado no Legislativo Municipal. A matéria impede que conselheiros municipais ou suplentes, condenados pelos crimes de enriquecimento ilícito e improbidade administrativa, injúria racial, racismo e homofobia, e violência contra mulher, criança, adolescente, idoso e pessoa com deficiência, sejam nomeados.

Na mesma temática, a parlamentar também formulou o Projeto de Lei Complementar 4/2021, que estende a punição aos servidores que ocupem cargos em secretarias, fundações, comissões e autarquias municipais. As pautas, aprovadas por unanimidade entre os vereadores, ainda aguardam sanção do executivo.

“Diante do cenário que a gente vive, o ataque aos direitos humanos é uma constante e precisamos garantir o mínimo de respeitabilidade nesses espaços públicos, que são espaços deliberativos muitas vezes. A gente precisa garantir que pessoas que tenham sido julgadas por esses crimes não ocupem esses lugares, porque acho que é o mínimo. Falamos tanto em transparência, tanto em combate à corrupção, precisamos começar pelas nossas entidades. Combater o preconceito e a disseminação da violência é um compromisso social que deve estar no nosso radar sempre”, comenta a autora.

Vereadora tem suas bandeiras bem definidas

O projeto não foi formulado com base em nenhum ato em específico, apesar de a aprovação ter acontecido dias após a polêmica fala do prefeito de Criciúma, Clésio Salvaro (PSDB), que, após o desligamento de um professor da rede municipal, afirmou que não toleraria “viadagem em sala de aula”. O docente havia reproduzido o clipe da música ‘Etérea’, do cantor Criolo.

“(O momento em que o PL foi aprovado) calhou muito bem. O projeto já tramitava na casa há um mês, e acabou que naquela semana o prefeito fez aquela fala lamentável para o cargo que ele ocupa. Foi um episódio em que no final de semana conseguimos colocar na rua mais de mil pessoas e na segunda-feira aprovar a lei por unanimidade”, destaca ela, fazendo referência à ação pró-LGBTQI+ realizada no Parque Centenário, em anexo à sede da Prefeitura de Criciúma.

Giovana conta que o objetivo das suas ações é ampliar o debate em torno do respeito à diversidade e aos direitos humanos. “Precisamos mudar isso na prática. A violência contra a mulher é um crime que vem sendo amplamente discutido. Precisamos garantir que esses espaços sejam seguros para que as pessoas convivam normalmente, para que as mulheres se sintam à vontade, não tenham medo diante de um cenário de conviver com algum colega de trabalho que já tenha agredido uma mulher”, salienta. A lei trata apenas de processos que já tenham transitado em julgado, isto é, quando a sentença é definitiva e não possui mais recursos para recorrer. “Não é com qualquer denúncia que já será proibido de assumir, para garantir que todo o processo jurídico seja respeitado”, acrescenta.

Expectativa

A vereadora acredita que o PL 55/2021 não será sancionado pelo prefeito Clésio Salvaro. Segundo ela, nesses nove meses de mandato, nenhuma das cinco leis aprovadas em seu nome foram acatadas pelo chefe do poder executivo criciumense. “Ele nunca assina minhas leis, acredito que seja algo particular comigo. Infelizmente. Fico triste em ver a cidade decorada de roxo em agosto, em alusão ao mês do combate a violência contra as mulheres, mas as leis que eu aprovei sobre a pauta não serem sancionadas por ele. Todas acabaram sendo sancionadas pelo presidente da Câmara (Arleu da Silveira)”, afirma.

Giovana foi a voz mais ferrenha que confrontou Salvaro depois do episódio encarado como homofóbico pela comunidade LGBTQI+. No mesmo dia em que a fala foi divulgada nas redes sociais do prefeito, ela apresentou uma denúncia junto ao Ministério Público. “Este não é um caso isolado, pois em 2017 ele já havia feito declarações bem semelhantes, atacando a população LGBT. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal equiparou o crime de homofobia como o crime de racismo, de acordo com a Lei nº 7.716 de 15 de janeiro de 1989″, complementou a parlamentar.

Conselho Municipal da Igualdade Racial atesta importância das leis

Na visão de quem exerce o papel de promover a igualdade racial em Criciúma, as matérias levantadas serão de grande valia. Ao menos, servirá para punir um infrator de trabalhar. “Acompanhamos projetos semelhantes que já foram desenvolvidos em outros municípios e acreditamos que a prática da discriminação racial, como qualquer outra prática discriminatória, já demonstra que, se a pessoa já foi condenada por um crime desse tipo, não tem condições de lidar com o público. Porque, ao trabalhar com a população em geral, ela terá algum tipo de preconceito, e se chegou a ser condenado, nada mais salutar que seja proibido de ser nomeado por qualquer repartição”, opina Rémerson Luiz Vicência, presidente do Conselho Municipal da Igualdade Racial.

Uma sociedade livre de preconceitos deve começar pela política, diz Rémerson

A discriminação racial é uma realidade em Criciúma. O objetivo do conselho é, por meio de ajuda jurídica e psicológica, prestar todo o amparo às vítimas, que, em muitas oportunidades, não sabem qual caminho tomar. “O conselho está atento a todas as demandas que envolvam procedimentos de injúria racial na nossa cidade. Recentemente recebemos um caso que estamos investigando, em uma escola do município, onde uma professora desdenhou do cabelo de uma criança. Estamos fazendo todo o acompanhamento da criança, da mãe, ouvindo a professora e os responsáveis pela escola. Esse é o nosso papel”, destaca.

Uma nova conquista para as mulheres

A Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, Maria Estela Costa da Silva,  também foi enfática ao valorizar a criação do novo projeto. “Penso que veio para fortalecer todas as lutas, mas principalmente na questão da mulher. É um subsídio a mais, mais uma força para o nosso movimento. É mais uma forma de coibir essa violência, uma arma que temos para lutar. Vejo que a vereadora tem o desejo de estar junto conosco nessa batalha, que não tem fim”, observa.

Respeito às minorias

Ter uma lei que promova a igualdade, o respeito e a tolerância também é bem vista pela comissão dos direitos humanos da OAB Criciúma. “O problema é que vivemos momentos difíceis, inclusive em nossa cidade, com evidente intolerância a muitos desses grupos vulneráveis, o que faz com que leis como essa se tornem ainda mais importantes”, reflete Valéria Zanette, presidente da comissão.

Assim como Rémerson, ela avalia como imprescindível a certeza de que servidores condenados por crimes contra minorias e improbidade administrativa sejam impedidos de trabalharem com o público. “Ao se iniciar pensando no maior desafio da democracia que é uma maioria que precisa legislar e administrar também em prol das minorias, é fundamental que os conselhos e órgãos municipais sejam compostos por pessoas com conduta ilibada e abertas a esse espírito democrático, despidos de qualquer preconceito”, conclui Valéria. 

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